Por: Annie Miller Slowli A interpretação de sinais através de diferentes rituais e métodos para a predição de eventos futuros é uma...

Sobre Tripas de Aves e Bolas de Cristal


Por: Annie Miller Slowli

A interpretação de sinais através de diferentes rituais e métodos para a predição de eventos futuros é uma prática tão antiga quanto o surgimento dos bruxos, e foi um dos pilares fundamentais para o estabelecimento e evolução da sociedade mágica. Nos tempos áureos da Adivinhação, quando se valorizava seu estudo como essencial para a relação e compreensão da natureza humana e as coisas ao seu redor, prever o futuro era algo cotidiano para qualquer pessoa, de modo que emergiram as mais diversas formas divinatórias. Nas casas, era comum guardar cartas de tarô debaixo do leito, ter livros de quiromancia sobre a mesa-de-cabeceira e reunir a família na hora do chá para ler as borras. E, geralmente para figuras mais ricas e ligadas ao poder, existia o hábito de pagar supostos clarividentes para consultas pessoais. No entanto, a conduta de predizer o futuro, construída ao longo de séculos pela sociedade, terminou por minguar de forma drástica e súbita.

O isolamento da Adivinhação se deu por uma combinação de mudanças sociais e comportamentais das últimas décadas. Atualmente, o apreço pelo destino foi trocado pela satisfação dos desejos vigentes. O avanço do materialismo e do racionalismo (em boa parte influenciado pelo Mundo Trouxa) e a preocupação com o imediato dispensaram a necessidade de prever algo distante do momento presente. A ocupação com as tantas responsabilidades da rotina não dá espaço para um desassossego a mais que talvez nem venha a acontecer.

Mas não foram apenas fatores alheios à Adivinhação que a atingiu negativamente. Todos sabem que práticas divinatórias não são sempre precisas, visto que cada ato e suas consequências podem resultar em um futuro totalmente diferente, e esse fato por si próprio já desperta o ceticismo de muitos. Com a erupção de métodos divinatórios desconexos e de profissionais informais dessa área, muitas vezes charlatões mal-intencionados sem nenhum conhecimento e em busca de dinheiro, a desconfiança da população expandiu-se ainda mais. Tal descrédito foi crucial para o abandono das práticas divinatórias e para a procura de seus profissionais.

Como consequência desse desprezo, entidades e o mercado se adaptaram à nova realidade. Nota-se a ausência de instituições relevantes que venerem assuntos ligados à Adivinhação (o Departamento de Mistérios e o Hall de Profecias não se encaixam nesse quesito, pois seu serviço confidencial é mais relacionado ao conteúdo de profecias e pesquisas gerais do que da adivinhação em si). A falta de lojas direcionadas a produtos dessa área prejudicam consumidores interessados nas artes divinatórias, que precisam procurá-los em locais geralmente duvidosos e inseguros. Até mesmo livros desse gênero são difíceis de se encontrar, impedindo que bruxos se atraiam pela Adivinhação através da leitura. Apenas exemplares didáticos ficam disponíveis com maior frequência, demanda requerida pelos alunos de Hogwarts que decidem estudar a matéria opcional de Adivinhação.

Uma das impressões deixadas desde o início de tal “crise” é a de que o dom da vidência, que sempre foi muito raro entre os bruxos, parece inexistente hoje em dia. Profecias que vinham a público e se concretizavam tornavam-se motivo de muita repercussão e atraíam o interesse geral. Muitos desses indivíduos se tornaram personagens memoráveis por disponibilizarem profecias impactantes em eventos bruxos (mesmo sem se lembrarem de nada do que predisseram). Mas, recentemente, os clarividentes aparentemente se voltaram para adivinhações de escala pessoal e familiar. É claro, eles não têm controle sobre suas profecias, mas é perceptível a falta de registro de visões que abrangem todo o Mundo Bruxo. Talvez a descrença tenha afetado sua dádiva da mesma forma que limitou a ação das diversas outras formas de previsão.