Por: Milla Hoff. Rolstroy Os contos de Beedle, o Bardo, representam uma coletânea de histórias populares para jovens bruxos e bruxas...

A nova perspectiva dos contos de fada

Por: Milla Hoff. Rolstroy




Os contos de Beedle, o Bardo, representam uma coletânea de histórias populares para jovens bruxos e bruxas. As histórias de Beedle associam-se aos contos de fada, querendo passar alguma lição de moral conforme a eminência do final feliz. No entanto a versão mais conhecida destes contos é a adaptação de Beedle para crianças, que traz consigo a felicidade da personagem como forma de recompensa pelos bons atos cometidos. Esta nova coletânea de histórias vai mostrá-los a versão real, e assustadora, das histórias de Beedle.

O bruxo e o caldeirão saltitante

Como toda boa história, esta não poderia começar de maneira diferente.

Há muito e muitos anos, existiu um velho bruxo bondoso. Nossa personagem residia na companhia de trouxas, ganhando-os por favores, o que logo o tornou amado. A magia praticada ali não podia ser dita de maneira expressa para os outros, que logo recriminariam tamanha abominação, portanto o velho afirmava possuir um caldeirão mágico, conhecido como panelinha da sorte. Curava males e pestes, agraciando não somente a população local, e sim também a todo um contingente de forasteiros.

O bruxo morreu de velhice, tendo tido uma longa e prazerosa vida. Para trás deixou o seu filho, que nada tinha de semelhante a si em sua personalidade. Este, ao vasculhar os pertences do pai, deparou-se com a dita cuja panelinha da sorte, na qual encontrou um embrulho com o seu nome. A expectativa o tomou, levando-o a imaginar presentes grandiosos, no entanto deparou-se com uma pantufa grossa e macia, pequena e sem par. O bilhete ali atrelado dizia: “Amo-te filho, portanto espero que nunca tenhas de usá-la”. Decepcionado, o filho atirou a pantufa dentro do caldeirão, amaldiçoando assim a caduquice de seu falecido pai.

                Naquela mesma noite, eis que batem à sua porta.

                - Meu senhor, minha neta padece de verrugas. O seu pai tinha por costume ajudar-nos... – A camponesa suplicou.

                - O quê tenho eu a ver com meu pai?! – Exclamou o filho, furioso – Trate de sumir daqui o quanto antes! – Disse e deu-lhe as costas.

                Assim que voltou para dentro de casa, escutou ruídos vindos da cozinha. Lá o velho caldeirão de seu pai tinha obtido um pé de latão, que antes não era visto ali. O caldeirão pulava no meio da cozinha, seu barulho tão insuportável que feria os ouvidos. Ao se aproximar, o bruxo percebeu a presença de verrugas na superfície antes lisa do caldeirão. Assustado, tratou de tentar livrar-se da aberração, no entanto feitiço algum surtia efeito. 

                - Mas que objeto repugnante! – Bradou a plenos pulmões, retirando-se até o seu quarto. O caldeirão seguiu-o, emitindo batidas surdas e estridentes.

                O bruxo não conseguiu livrar-se do caldeirão. Teve poucas horas de sono, vencido pelo barulho insuportável. Ao acordar, descobriu-se que aquilo não se tratava de um pesadelo. Não havia maneira de dar um fim àquele incômodo? O filho desceu as escadas com passos pesados. Mal tinha levado a primeira colherada de mingau até a boca quando a porta bateu.

                - Minha velha jumenta perdeu-se ou foi roubada, senhor. – O velho disse – Caso não a encontre, passarei fome!

                - Fome tenho eu! – Novamente a visão das costas do bruxo findaram tal diálogo.

                Naquele mesmo instante, ao retornar até a mesa e sentar-se, foi possível escutar algo novo. O caldeirão emitia zurros, além de gemidos humanos a pedir por comida. Este acréscimo sinfônico deixou o bruxo ainda mais irritado, a ponto de passar a corda pelo pescoço. Não importava o que fizesse, nada parecia ser o suficiente para calar e/ou forçar o caldeirão a parar de segui-lo; sempre acompanhado de sua melodia característica.

                À noite, procuraram-no outra vez.

                - Meu filho está gravemente doente e o seu pai...

                A porta bateu. Dessa vez não houve diálogo, tamanha era a ira do condenado. O caldeirão começou a se debulhar em lágrimas. Além das batidas surdas e estridentes, o choro, zurro e gemido tinham se juntado a orquestra definitivamente. Depois daquela noite, ninguém tornou a procurar o bruxo, no entanto os sintomas do caldeirão persistiam, aumentando em intensidade e número conforme o passar dos dias. Havia vômito no carpete, queijo estragado e leite azedo. E paz? Era a única coisa inexistente. Como não conseguia dormir ou comer, o bruxo decidiu resolver a situação. Com o caldeirão a segui-lo, saiu para as ruas do vilarejo.

                - Tragam-me os seus problemas! Posso ajudá-los, tal como o meu pai fazia. Venham todos! – Bradava a plenos pulmões o anúncio.

                Ninguém apareceu. A cada rua percorrida, o bruxo olhava ao seu redor e sentia a loucura lhe subir a cabeça. Bateu na porta de seus vizinhos, jorrando-lhes benções e prometendo trazer a saúde de volta as suas casas, no entanto pessoa alguma apareceu. A caminhada tortuosa durou horas. Seus pés tinham calos, a presença do caldeirão impossível de conter o havia deixado com o olhar de um louco. No nascer do dia seguinte, o bruxo ainda vagava, longe do vilarejo de onde havia partido. As pessoas do vilarejo comentaram tê-lo visto comer os próprios dedos, outras diziam que o espírito do pai havia amaldiçoado a panelinha mágica para castigá-lo por sua insolência. E os viajantes afirmavam ouvir gemidos na noite, recheados pelo choro de criança e o cheiro fétido de comida estragada. O seu rosto jamais foi visto.